domingo, 13 de maio de 2007

Plaqueta



O caixão adentra a sala, para virar apenas mais um móvel fúnebre.
As viúvas choram, Ou silenciam.
Os transeuntes parecem nem perceber a presença do corpo.
E o corpo, está ali. Estático. Frio. Inerente.
As pessoas ao redor, murmurejam:
-- Descansou, descansou.
Como se um corpo morto, sem vida, pudesse sentir algo.
A alma, esta também não descansa, começa agora a vida eterna.

Pela primeira vez, sinto a morte tão perto de mim, tão perto que posso senti-la. Ela não cheira mal, nem assusta. A morte e sua roupa de cetim. O seu beijo estranho. De repente, amo-a e detesto-a.
Farto-me de respirar este ar mórbido, de ver as janelas abertas, e a poltrona vazia, vazia, vazia...
As horas parecem não passar, mas mesmo assim o dia finda. A noite chega, à noite e sua lua de prata. Lua que brilha contida, calada em si.
A chuva parece vir, e eu penso como seria se viesse. A tempestade que não vem, me distrai. Gosto tanto dos pingos da chuva. Dos relâmpagos e dos trovões.
Calada em mim, com suspiros leves, e pequenos sorrisos cordiais.
As lembranças, vadeiam, rodopiam, bamboleiam, dançam em mim.
Cada pessoa ali, parada, imersa em sua própria arrogância, esperando um pouco de atenção.
As palavras hoje não têm sentido. Hoje a tristeza não é passageira. O hoje poderia ser apenas mais um ‘hoje’, se não estivesse ali, diante de mim aquele corpo gélido, aquele rosto, e o olhar fechado.
Todos se afastam. Eu não afasto a tristeza de mim.
Gostaria tanto de sentir a presença de alguém em mim, mas não há, não existe nada nem ninguém que venha suprir, então, saciar, ao menos, contemplar o vazio que cabe em mim.
As horas passam. O frio chega. A madrugada.. Ah! Madrugada leva-me contigo! Tira-me do silencio e da morbidez de teus passos lentos.

Passa tempo. Passa-tempo. Passa-tem- po.

O sol nasce, e nunca doeu tanto sabê-lo. Tento pensar, mas não consigo.
O fato é que tenho que agir, apressar-me. Para que? Para ver o corpo adentrar a sepultura, e saber que voltará às fileiras, à terra de onde veio.
A casa bombeia gente. Os pastores cantam. As negras viúvas, que expõem seu negro tecido ao sol quente da manha, que sentem a pele queimar, e não sentem dor alguma, choram.
Enfim, o cemitério. O carro fúnebre. O carro negro. O carro patriarca.
A sepultura já a espera. Me dói, dói profundamente ver aquela caixa de madeira precisamente detalhada e coberta com flores, cheia com cenas de adeus.

Mas o que me rompe completamente, é saber que aquele corpo que já foi matéria, já foi peso, risos e lembranças, que já foi dança em mim, histórias e lições, que é dono da minha geração,sangue que corre no meu, e que acima de tudo foi um ser humano, adentra aquela cova para findar como saudade e uma plaqueta de ‘Aqui jaz’.


À minha perda, à minha saudade e à memória de Vovô Silvino.

12 comentários:

Taís. disse...

que massa...
adorei.
muito bem escrito,
vocabulário interessante,
tema interessante,
bom de ler...


Clarissa, tu é fodona.
xD

Fellipe Melo disse...

adorei!!!
muito foda!!

Diogo Testa disse...

CLARI!!!

Que viagem cara!!!

BIxo, fui p/ lugares que desafiam as lógicas dos homens! MTO BOM!

Vlw Clari, tava ótimo, sério, fui mto longe, q viagem!

Abração!!!

Karlinha disse...

Que texto massa...


Ai, que orgulho de ser sua irmã!!!


te amo

Dayanne Figueirêdo disse...

Só pra discordar,




Tá muito ruim vei...
;D~


(Só pra não ter que dizer ao contrario.)

;*~

Augusto Bortolini disse...

"Farto-me de respirar este ar mórbido, de ver as janelas abertas, e a poltrona vazia, vazia, vazia..."

"Enfim, o cemitério. O carro fúnebre. O carro negro. O carro patriarca."

Anáfora poética.

Agora é minha vez:


Chorei.

Andei devagar,andei sem pressa,andei sem vagar,andei sem meios de amar. E por isto chorei,chorei pernoite,chorei em toda frota,que não imaginava escorrer; Chorei. Chorei. Chorava! Até que choveu. E da fruta amarga cada ventura amarga,como o amargo do ocaso - o sol se pôs e diante disto meu saldo é a soidade - Ainda assim,não,não tenho a pluma que reveste meu corpo,como as assustosas aves que pairam de tanta pena,despenando até que nuas possam oscilar,como meros amantes da êfemeridade. Já tenho idade,trindade,veracidade,que jamais me salvará.

Christoval Araujo disse...

Clary gostosaaaa!
Cara,
Mermão,
Tipo,,,
Show d+ pow..
Tu manja, ta ligada?
Tá cagando mó bomba!!!!
Só tenho orgulho de ter uma funcionária como você!

Unknown disse...

Compañera...material muito bom. Ainda bruto, mas bom. Precisa ser trabalhado, organizar um pouco as imagens; mas sem perder seu carácter fluido, sem amarras, que vem de suas associações mentais.Talvez também trabalhar melhor estas citações que vc faz (Raul, Renato Russo, etc)Uma pergunta: O que você quer dizer com "E o corpo, está ali. (...)Inerente" ? "Inerente" é mesmo a melhor palavra aqui? Gostei, em termos literários (claro!), dessa sua morbidez. Essa coisa do corpo, que é vida, que é desejo de vida, mas que morre. Em vários momentos do texto, a morte aparece como horizonte de desejo, lembra as morbidez da primeira geração romântica. Mas a sua visão da morte parece ser bem pessoal. A morte, que deveria ser nosso último alento, é "interrompida" pela vida eterna. Gostei dessa idéia! Bem, de fato, gostei do texto. Realmente, preciso andar mais pela sua cooluna. Sei que vc não pediu opinião, mas resolvi colocar a minha aqui assim mesmo. Baby, mil beijos! Continue escrevendo assim. Mas, se possível, abandone a morbiidez. De fato, ela não faz bem. Apesar de ajudar a escrever muita coisa boa.Xêro! Xêro! Xêro!

Thya Thacy disse...

POxa menina..adorei teu blog..ainda nao tinah entrado aki com tantos textos..
agradeço a visita ao meu...
sempre q puder darei uma olhadinha em seus ensaios literarios..

ahh muito bom o conto.. primeiro de varios espero... vc tem taleto..

kisses

Unknown disse...

mininaaaa..tu bota pa fuder viu!
puta q massaa!! ^^ adorei mesmo..
maas.. precisamos conversar..:)
=*******

Unknown disse...

Clari, muito bom. Dizem que o alimento de um bom escritos são os livros e o exercício da escrita, pra mim o processo de criação de um texto, poesia, crônica... enfim, é a vivência, simplesmente isso; viver! O corpo de um escritor é formado por livros e sua alma é o que ele sente. Alguns escritores chegaram ao extremo dos sentimentos, como a Clarice Lispector, que até levou fama de "meio louca".
Veja esse trecho de um livro que estou lendo:

“A poesia é para quem, gosta de errar pelos vales e campos, pelas ruas sujas, pelos becos sem saída, gente que chora a vida que se escoa lenta, longa e em vão, que ama a triste noite e suas negras asas, a poesia não é a tradução das estrelas, nem da brisa na palmeira, nem do murmúrio das florestas, a poesia é dor, sofrimento, espinho da vida a se entranhar no coração do poeta, poeta é aquele que sofre sem motivo, aquele que tem a inocência de determinar para sua vida sacrifícios de que ninguém toma conhecimento e a ninguém interessa, a não ser a algumas almas compassivas, as pessoas se interessam mais pelo brilho do poeta que sabe acender uma festa do que pela poesia em si, ou pelo poeta humano”
(‘A poesia, o poeta’ em Dias & Dias)

É da Ana Miranda, uma escritora que estou gostando muito. Tente florescer uma nova primavera pela sua estrada, assim o sol a ensolará.

Canto de Versos disse...

Seu pai me indicou. E provei e aprovei suas palavras. Muito bom, vou lhe seguir!!!! abraço. Ramon