Ela sentou no divã.
A sala era verde-bebê.
O ambiente era rústico; os móveis, todos madeira velha e mal envernizada.
Tocava um "Harmonium Andino".
Um jaleco alto, de olhos profundos, facilmente desvendáveis, e rosto fechado, entrou na sala.
Solicitou, com olhar conformado, que a menina ficasse a vontade, pressionando-lhe levemente os ombros, para que deitasse no divã.
A menina, em desconforto, obedeceu.
O jaleco, vestido de um branco paz sem utilidade, a não ser dá-lhe a condição médica, sentou-se numa cadeira de couro, atrás do divã; Na escrivaninha de madeira enrustida, pegou um bloco de notas e uma caneta esferogáfica preta.
Dez minutos de silêncio..........
- Eu não tenho todo o dia. - Retrucou o jaleco.
- Eu tenho.
2 minutos de incomodo silêncio..
- O que você espera dessa consulta?
- Um laudo.
- Huuumm...
- O que te trouxe aqui?
- A curiosidade.
- Achei que fossem os problemas...
- Não, não. Meus problemas eu já conheço, de longa data.
- Então...., quais os seus problemas?
- Visuais, meu caro.
O jaleco estava inquieto; Mexia, incessantemente, os pés.
As pernas cruzadas; Impaciente.
- Eu pareço oftalmologista?
- Na verdade, você me parece um jalecozinho rude, que não suporta mais o que faz; Não aguenta mais os velhos pacientes, e os seus velhos, mesmos, problemas insolucionáveis. E, de alguma forma estúpida, você se sente fadado a esta realidade, por que pensa não saber fazer nada além disso; Você não é capaz de ver, nem sentir que sabe ser bem maior.
O homem e seu jaleco estremeceram junto ao coração. Ele respirava ofegante; Sorria, descontroladamente, em desespero.
A menina, estava serena. Cruel. Parada, olhando para o teto, sobre o divã negro e macio moldando-se ao seu corpo.
- Quem está dando o laudo a quem? - Disse o jaleco, em um desdém desesperado.
- Ninguém.
- Você está me analisando, menina?
- Não. Eu estou enxergando você.
Um silêncio aterrorizante tomou a sala. O homem-jaleco parecia ter esvaziado.
A menina prosseguia estática; imóvel.
Dos olhos profundos e ríspidos uma lágrima, como fugitiva, surgiu. De repente, a sala fez-se de um pranto triste e revelador.
O homem, com a face inundada, esboçou, rapidamente, no bloco de notas. Jogou o jaleco ao chão, como um animal que deixava a velha pele. Destacou a folha do bloco, e segurou-a tão firmemente que ouvia-se o amassar do papel. Entregou à menina, como quem deixa a vida, resistiu um pouco, pressionando, ofegante, a mão da menina.
Ela, dura, sentiu o calor daquele homem que acabava de ceder à vida.
Os olhos vermelhos, cruzaram com os olhos de lupa, e o instante cicatrizara no coração do homem.
Ele, assim como um anjo que acaba de descobrir o poder das asas, deixa a sala; Batendo a porta, deixando uma certeza de jamais voltar ali.
A menina, no divã, sorriu, num delicioso (e cruel) desdém.
Leu, então, as palavras no papel amassado e ainda quente:

- "Vai ver o acaso entregou alguém pra lher dizer,
o que qualquer dirá." - Disse a menina, sorrindo, prestes a chorar.
Levantou-se, guardou o papel, e deixou a sala escura, trancada, com o jaleco estirado, frio, lá dentro.