(A menina e o despertar)
Rodava. Dentro da cabeça rodavam um turbilhão de cores, de sons, de gestos.
"Há quanto tempo você mora aqui?"
"Orfã."
"Por que púrpura?"
Perguntas e respostas. Olhares e propostas. Dias. Noites. Manhãs e mais manhãs. Músicas e chocolates. Par e pôr-do-sol.
Algo transcendia e sugava sua alma-menina em fulgores relutantes.
Respiração ofegante. Pupílas dilatadas.
Os olhos abrem, mas parecem resistir em reviver.
Abrem e fecham diversas vezes num único instante.
Mas, não há escolha: é vida!
A menina percebe-se estranha, algo acontecera.
O corpo úmido de suor e os olhos vidrados no teto.
Ela corre as mãos pelo colchão na tentativa de reconhecer o espaço. Estava ela, deitada naquele que já não parece tão bolorento, frente a janela amarela.
O quarto agora compõem-se com guarda-roupa, escrivaninha, abajur, livros e cigarros. Do alto da janela, desce uma cortina semi-transparente com detalhes de flores e ramos.
A menina desespera-se: este não é o seu espaço, esse não é seu corpo, essa não é ela.
Ela levanta, corre até a janela e escancara a cortina:
Do outro lado da rua, a sacada é vermelha e uma senhora com seus pesados 65 anos rega pequenos vasos de orquídeas vagarosamente.
Os olhos de lupa examinam toda a rua, ponta a ponta, sacada por sacada, porta a porta, janela a janela, rosto a rosto, correndo de um lado a outro diversas vezes.
Ela tocou lentamente seu corpo: examinou a blusa branca e short jeans que vestia.
Começou a andar pela casa examinando cada cômodo, cada cheiro: a cozinha estava limpa, os livros e papéis arrumados, portas e janelas trancadas, as cartas sobre a mesa.
Tudo era confusão.
Havia ausência nas paredes, no teto, no vento, em cada fio de cabelo, nas xícaras vazias, nas fotografias e no coração pulsando lentamente dentro da menina. Uma falta maior que a capacidade de ser.
Suavemente uma música balançou a cortina da varanda tocando a menina com um afago amante, carnal, delirante e a ela percebeu vida entrar através da única fresta de lucidez que ocupava aquele espaço:
"Não há nada em ti que não reflita em mim.
Os seus olhos me escondem, não me deixam partir.
Ensaia confusões pr'eu não me esquecer de viver no seu mundo
E tentar te entender." *
Ela sorriu um prazer delicado e pungente, correu para a varanda em busca da fonte sonora: na rua, um menino sentado na calçada tocava violão e olhava para o céu, abismado com as cores celestes ao entardecer.
A menina respirou sua última esperança, ajoelhou-se, olhou o céu e chorou.
A campainha toca.
* Música: Entender você - Aguarráz
"Há quanto tempo você mora aqui?"
"Orfã."
"Por que púrpura?"
Perguntas e respostas. Olhares e propostas. Dias. Noites. Manhãs e mais manhãs. Músicas e chocolates. Par e pôr-do-sol.
Algo transcendia e sugava sua alma-menina em fulgores relutantes.
Respiração ofegante. Pupílas dilatadas.
Os olhos abrem, mas parecem resistir em reviver.
Abrem e fecham diversas vezes num único instante.
Mas, não há escolha: é vida!
A menina percebe-se estranha, algo acontecera.
O corpo úmido de suor e os olhos vidrados no teto.
Ela corre as mãos pelo colchão na tentativa de reconhecer o espaço. Estava ela, deitada naquele que já não parece tão bolorento, frente a janela amarela.
O quarto agora compõem-se com guarda-roupa, escrivaninha, abajur, livros e cigarros. Do alto da janela, desce uma cortina semi-transparente com detalhes de flores e ramos.
A menina desespera-se: este não é o seu espaço, esse não é seu corpo, essa não é ela.
Ela levanta, corre até a janela e escancara a cortina:
Do outro lado da rua, a sacada é vermelha e uma senhora com seus pesados 65 anos rega pequenos vasos de orquídeas vagarosamente.
Os olhos de lupa examinam toda a rua, ponta a ponta, sacada por sacada, porta a porta, janela a janela, rosto a rosto, correndo de um lado a outro diversas vezes.
Ela tocou lentamente seu corpo: examinou a blusa branca e short jeans que vestia.
Começou a andar pela casa examinando cada cômodo, cada cheiro: a cozinha estava limpa, os livros e papéis arrumados, portas e janelas trancadas, as cartas sobre a mesa.
Tudo era confusão.
Havia ausência nas paredes, no teto, no vento, em cada fio de cabelo, nas xícaras vazias, nas fotografias e no coração pulsando lentamente dentro da menina. Uma falta maior que a capacidade de ser.
Suavemente uma música balançou a cortina da varanda tocando a menina com um afago amante, carnal, delirante e a ela percebeu vida entrar através da única fresta de lucidez que ocupava aquele espaço:
"Não há nada em ti que não reflita em mim.
Os seus olhos me escondem, não me deixam partir.
Ensaia confusões pr'eu não me esquecer de viver no seu mundo
E tentar te entender." *
Ela sorriu um prazer delicado e pungente, correu para a varanda em busca da fonte sonora: na rua, um menino sentado na calçada tocava violão e olhava para o céu, abismado com as cores celestes ao entardecer.
A menina respirou sua última esperança, ajoelhou-se, olhou o céu e chorou.
A campainha toca.
* Música: Entender você - Aguarráz
7 comentários:
Ela voltou.
"Os olhos abrem, mas parecem resistir em reviver."
"Começou a andar pela casa examinando cada cômodo, cada cheiro: a cozinha estava limpa, os livros e papéis arrumados, portas e janelas trancadas, as cartas sobre a mesa.
Tudo era confusão."
posso passar a vida toda copiando as citações sem cansar
e a música, que música!
mal posso esperar por mais, vc sabe que eu fico sem palavras, vou ficando por aqui
=*
lindo, lindo mesmo.
A palavra é semente
Que floresce na luz de cada alma e enternece
Às vezes é doce veneno
Às vezes taça de cidra que o peito aquece
Ser Poeta é tanto, tão pouco
É transformar em crentes os ateus
É domar todas as tempestades da alma
É estar mais perto de Deus
Bom fim de semana
Mágico beijo
Eu li essa continuação no mesmo dia que você publicou, depois reli as partes anteriores e esta mais uma vez... mas não sei porque comentei.
Vou ler de novo. =D
É mesmo, porque púrpura, porque não a menina da sacada preta?
uahauhauahuaha
lindo Clarissema, continue.
Muuuuito lindo seu blog!!
=P
Beijao
"Por que púrpura?", Clari?
*-*
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